Uma nova forma de vida foi descoberta, resultante da fusão de uma bactéria com uma alga
Por
Gustavo José
maio 17, 2025
Pesquisadores descobriram uma forma de vida extremamente rara que surgiu da fusão de uma alga com uma bactéria fixadora de nitrogênio há 100 milhões de anos. Esse fenômeno, conhecido como endossimbiose primária, ocorre quando um organismo engole outro, transformando-o em organelas como mitocôndrias e cloroplastos. Este é o terceiro caso relatado de endossimbiose. Este caso poderia abrir caminho para uma produção de azoto mais sustentável para a agricultura.
Nos 4 bilhões de anos de vida na Terra, apenas dois casos de endossimbiose primordial foram conhecidos até agora. A primeira ocorreu há 2,2 bilhões de anos, quando as arqueias engoliram uma bactéria e a incorporaram ao seu arsenal metabólico, transformando-a em mitocôndrias. Este passo foi um passo importante na evolução de todos os organismos da Terra, permitindo-lhes evoluir para formas mais complexas.
Mitocôndrias em uma célula.
A segunda endossimbiose primordial conhecida ocorreu há 1,6 bilhão de anos, quando organismos unicelulares engoliram cianobactérias capazes de converter luz em energia (fotossíntese). Essas bactérias evoluíram para cloroplastos, que ainda hoje usam plantas de clorofila para converter a luz solar em energia.
Por outro lado, acreditava-se que apenas bactérias poderiam extrair nitrogênio atmosférico e convertê-lo em uma forma adequada para o metabolismo celular (amônia). As plantas que são capazes de fixar nitrogênio (por exemplo, leguminosas) realizam esse processo colocando essas bactérias em seus nós radiculares.
A descoberta da equipe do Berkeley Lab virou essa noção de cabeça para baixo: pela primeira vez, uma organela capaz de fixar nitrogênio foi embutida em uma célula eucariótica (algas marinhas). "As organelas muito raramente surgem como resultado desse tipo de coisa [endossimbiose primária]", explica Tyler Cole, da Universidade da Califórnia, em Santa Cruz, em um comunicado de imprensa do Berkeley Lab. "O primeiro caso conhecido desse acontecimento levou ao surgimento de toda a vida complexa. Qualquer coisa mais complexa do que uma célula bacteriana deve sua existência a esse evento", diz, referindo-se à origem das mitocôndrias. A nova organela, descrita em dois estudos publicados nas revistas Cell Press e Science, foi apelidada de "nitroplasto".
Uma organela distinta
Foram necessárias várias décadas de trabalho para descobrir essa organela. Em 1998, os cientistas descobriram uma pequena sequência de DNA que acabou vindo de uma cianobactéria fixadora de nitrogênio (UCYN-A) encontrada no Oceano Pacífico. Por outro lado, outra equipe da Universidade de Kochi (Japão) identificou uma alga marinha (Braarudosphaera bigelowii) que acabou sendo hospedeira simbiótica da bactéria. O DNA da bactéria foi encontrado em grande quantidade em células de algas.
Embora os pesquisadores pensassem que a UCYN-A era um simples endossimbionte da alga, dois novos estudos sugerem que ela evoluiu com seu hospedeiro para se tornar uma organela por direito próprio. Após mais de 300 experimentos, a equipe japonesa conseguiu isolar e cultivar as algas em laboratório. Isso permitiu que eles mostrassem que a proporção de tamanho entre UCYN-A e hospedeiros algais é a mesma entre as espécies.
Os pesquisadores também usaram um modelo computacional para analisar o crescimento da célula hospedeira e das bactérias durante a troca de nutrientes. Eles descobriram que seus metabolismos estavam perfeitamente sincronizados, permitindo-lhes coordenar seu crescimento. "É o que acontece com as organelas", explica Jonathan Zehr, da Universidade da Califórnia, em Santa Cruz, e coautor de dois estudos. "Se você olhar para as mitocôndrias e cloroplastos, eles são a mesma coisa: evoluem com a célula", acrescenta.
Os especialistas também mostraram que a bactéria UCYN-A depende da célula hospedeira para replicar a proteína e se replicar. Para isso, eles usaram imagens de raios-X e tomografia para observar processos celulares em tempo real. "Com imagens de raios-X, mostramos que os processos de replicação e divisão das algas hospedeiras e endossimbiontes estão sincronizados", explica Carolyn Larabell, do Berkeley Lab.
A ilustração mostra algas em diferentes estágios de divisão celular. UCYN-A, uma formação fixadora de nitrogênio que agora é considerada uma organela, é mostrada em azul; O núcleo das algas é azul, as mitocôndrias são verdes e os cloroplastos são roxos.
As proteínas dos dois organismos também foram quantificadas. Descobriu-se que cerca de metade das proteínas UCYN-A são sintetizadas pela célula hospedeira, que as marca com uma sequência de proteínas específica. Esse rótulo permite que a célula os envie para o nitroplástico, que os importa e os utiliza em seu próprio metabolismo. "Essa é uma das características do que vai de um endossimbionte a uma organela", explica Zehr. "Eles começam a jogar fora pedaços de DNA, seus genomas ficam cada vez menores e começam a depender da célula-mãe para transportar esses produtos gênicos para dentro da célula."
Potencial para uma produção de azoto mais sustentável
Os pesquisadores estimam que os nitroplásticos surgiram há cerca de 100 milhões de anos. Como a UCYN-A está presente em quase todos os oceanos do mundo, é provável que esteja envolvida no ciclo do nitrogênio na atmosfera. Essa descoberta pode ter grandes implicações para a agricultura, já que o processo industrial atualmente usado para converter nitrogênio atmosférico em amônia (o processo Haber-Bosch) é muito intensivo em energia. Esse processo é usado para produzir 50% dos alimentos do mundo e é responsável por cerca de 1,4% das emissões de dióxido de carbono.
No entanto, muitas perguntas sobre nitroplastos e seu hospedeiro algal permanecem sem resposta. Como próximo passo, os pesquisadores planejam descobrir se ele está presente em outras células e quais consequências pode ter. Isso poderia permitir que a fixação de nitrogênio fosse integrada diretamente às plantas para aumentar a produtividade.
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